Com excitação boa ou má o resultado é o mesmo.
São muitas as vezes que perante comportamentos de morder ou abocanhar a roupa, as mãos ou a trela dizemos que o cão é mal comportado ou que é um cão dominante e quer tomar conta de nós. Quase sempre os resultados desses comportamentos são consequência da excitação, não de dominância, que o cão está a passar e esses comportamentos são o reflexo disso. Infelizmente, as más ideias são como os vírus tendem a manter-se presentes e a propagar-se. Não importa a origem da excitação, o resultado vai ser o mesmo, afinal é uma reação a um estímulo. A forma fisiológica como o corpo se prepara para lidar com uma situação excitante de qualquer tipo é a mesma (aumento do fluxo sanguíneo, aumento de neurotransmissores, aumento do ritmo respiratório) e isto leva a comportamentos semelhantes. A fronteira que define a zona ideal de bem estar e a zona do excesso é individual e variável. Obviamente, não é possível permanecer o tempo todo nessa zona pois os estímulos a que eles estão expostos não dependem somente de nós. A dificuldade aqui é definir quando é que se torna excessivo. Não existem fórmulas pois varia de indivíduo para indivíduo, por outras palavras, alguns cães têm uma grande resistência à excitação, para outros mexer um pêlo é já demasiado. O que provoca essa variação?
Tentar acalmar o cão pela força só vai aumentar o stress e prejudicar a sua relação com ele. Lembre-se que o que para si é diversão para eles pode ser uma situação difícil de gerir. Da próxima vez que o seu cão começar a morder a trela ou a roupa, pare e ouça-o. Muito provavelmente ele está a precisar de ajuda para acalmar e não está de todo a querer tomar conta de si.
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Por que é mais difícil para os cães asilvestrados adaptarem-se a viver num ambiente doméstico?5/4/2023 O Homem e o cão coevoluíram numa longa e dinâmica relação que afetou ambas as espécies ao longo da sua evolução. Ao longo deste caminho comum, em algumas ocasiões, os cães perderam o contacto com os seus companheiros humanos, o que resultou em mudanças comportamentais ou em feralização (voltar a um estado selvagem). Se tivéssemos que usar uma palavra para descrever a diferença entre cães de casa domésticos, cães de rua e cães selvagens (assilvestrados), seria "socialização". Em particular, socialização com humanos (sim, são três palavras). É a relação dinâmica entre homem e animal ou a sua ausência que define a domesticação e a feralização (Daniels e Bekoff, 1989). A feralização pode ser medida através da docilidade, usando a relação positiva entre a docilidade e a socialização (Hediger, 1964). Por outras palavras, a perda da docilidade, ou na mesma medida a perda de socialização, corresponde à feralização, uma vez que o surgimento da resposta de medo aos humanos é o resultado da falta de socialização com humanos ou da sua perda (Scott e Fuller, 1965; Daniels e Bekoff, 1989). A resposta de medo a estímulos desconhecidos surge em cães no período entre 7 e 14 semanas de idade (Freedman et al. 1961; Bekoff, 1989), também chamado de "janela" para a socialização (Scott e Fuller, 1965). Para prevenir o comportamento de evitamento de humanos em cães, o homem deve fazer parte do ambiente social nessa “janela" (Miklos, 2015). Se isso não acontecer, o cão se comportará como um animal não domesticado, assilvestrado e indomável (Daniels e Bekoff, 1989), porque ele reconhecerá os humanos como um elemento desconhecido e a ser temido. Da mesma forma, um cão pode ser feral não pela ausência, mas pela perda da socialização e convivência com os humanos (Daniels e Bekoff, 1989). No seu livro, Tenzin-Dolma (2015) descreve a adoção de Charlie, um cão feral, e o desafio representado em ajudá-lo a se adaptar a um novo mundo assustador e confuso. Ela considera os cães ferais mais parecidos com lobos do que com os cães com que normalmente convivemos, uma vez que o processo de feralização parece reativar comportamentos ancestrais, mesmo que sem se aproximar do fenótipo ancestral (Barnett e Rudd, 1983). A organização social dos cães assilvestrados é muito variada, provavelmente como resultado da interferência humana. Por exemplo, nos hábitos alimentares, onde podem ser alimentados diretamente (por exemplo, Cafazzo et al., 2010) ou ter livre acesso aos aterros sanitários, podendo influenciar diretamente ou indiretamente o tamanho do grupo. Isso pode variar desde indivíduos em forrageio até grupos mais estáveis, que permitem a defesa seu território coletivamente (Font, 1987; Macdonald e Carr, 1995). Finalmente, como Kaminski e Marshall-Pescini (2014) propuseram, sob certas condições ambientais, eles podem potencialmente formar grupos a longo prazo com seus congêneres, semelhantes às matilhas de lobos. Os cães têm sido categorizados para diversos fins, mas nem sempre obtendo uma imagem completa. Como exemplo, Høgåsen e colegas (2013) dividiram os cães em três grupos: Cães com dono - cães que têm um proprietário identificável, são socializados e não têm permissão para vaguear livremente. Cães com liberdade de movimento - cães que têm liberdade para se movimentar, mas são cuidados por alguém ou um grupo, e como resultado são socializados em algum ponto. Cães sem dono e sem contato com humanos - cães que estão provavelmente nas proximidades de locais humanos, mas não têm contato com humanos e, como consequência, não passam por um processo de socialização com humanos (selvagens). Claramente, é quase impossível enquadrar a diversidade comportamental dos cães, e cada classificação apresenta alguns limites. Outras classificações, por exemplo, incluiriam cães abandonados e fugitivos entre os cães que vagueiam livremente, como resultado da sua socialização provável, mas difícil de provar (2014). O habitat é crucial no processo de feralização, porque as condições ambientais, disponibilidade e quantidade de alimentos, abrigo e, claro, a proximidade humana influenciam o desenvolvimento do processo (Daniels, 1983; Daniels e Bekoff, 1989). Estudos de neurobiologia mostraram que, em humanos, bem como em cães, "... o desenvolvimento pré-natal é em grande parte impulsionado por processos genéticos, muitos dos quais são sensíveis à composição bioquímica da mãe [...]. No desenvolvimento pós-natal, no entanto, o ambiente desempenha um papel crucial no fomento do desenvolvimento, e as interações entre genética e experiências são responsáveis pela maioria dos resultados do desenvolvimento" (Tierney e Nelson, 2009). Sem diferenças genéticas entre cães assilvestrados e cães domésticos, as diferenças comportamentais são resultado de um processo de modulação epigenética, onde a predisposição genética é desenvolvida: "... o cérebro pode vir equipado com tendências para certas informações perceptuais, como para a fala, linguagem ou rostos, mas é a fala específica, a linguagem e o alcance de rostos a que estão expostos que impulsionam o desenvolvimento subsequente ..." (Tierney e Nelson, 2009). Conclusão Como seria de esperar, a adaptação de um cão selvagem à vida doméstica não é fácil. Ao crescer na natureza, um cão selvagem auto-suficiente depende da sua resposta ao medo para sobreviver. As suas respostas comportamentais são o resultado das características genéticas herdadas, mas também das experiências que constroem as conexões neuronais do seu cérebro. No final, um cão selvagem é ainda um cão doméstico, mas não tem as ferramentas necessárias para viver uma vida doméstica. Ele não conhece os humanos e na sua vida social a especial relação homem-cão não existe. A nossa vida doméstica está cheia de coisas percebidas como ameaçadoras, mesmo para um cão socializado. Em primeiro lugar, temos os humanos, como eles se comportam na presença de um cão e a forma como interagem com os cães, nem sempre correta. Depois, temos tudo o resto: o nosso mundo barulhento e rápido, as nossas máquinas, os nossos horários, a nossa falta de tempo, a nossa pressa, as nossas casas, as nossas regras, as nossas prioridades, muito frequentemente em colisão com o mundo do cão. Tenzin-Doma (2015) escreve em seu livro que o sucesso para a adaptação de um cão selvagem, ou qualquer outro cão, ao mundo humano dependerá do respeito que temos por ele e de como entendemos o seu comportamento e necessidades. Dependerá da nossa paciência, compaixão e vontade de fazer as mudanças necessárias em nossa vida, mesmo que drásticas. JP Referências
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Esta frase, traduzida do castelhano \ Portenhol, foi repetida por diversas vezes em várias das formações dadas pelo Jaime Vidal “Santi”. Eu talvez até poderia acrescentar “deveríamos-nos esforçar para causar sempre uma boa impressão com o nosso cão". Nem sempre entre pessoas esta tarefa é fácil e precisamos de tantos códigos e muita inibição, pois supostamente somos educados. “Como podemos saber que criamos uma boa impressão num cão?” poderiam perguntar. “Afinal eles não falam a nossa língua e se lhe perguntar, eles não me vão dizer”, acrescentariam vocês. Eu digo que só pensamos isso porque não estamos habituados a ouvir e só queremos ser ouvidos. Recordam-se do tempo em que não havia Covid? Daquelas pessoas que para vos falar vinham junto e quase encostavam a cara na vossa? E daquelas pessoas que durante uma conversa tocavam no vosso braço quase telegraficamente? E nas filas, quando tinham sempre alguém quase em cima? Já agora, nos elevadores, no metro, quando sentiam alguém tão próximo que sentiam o respirar perto da vossa cara. Os exemplos poderiam continuar, mas tenho a certeza que uma coisa era comum: o desconforto. As estratégias são variadas: desviar o olhar, dar um passo atrás, virar o corpo, olhar para o telemóvel e talvez outras coisas mais tensas, mas sempre sem palavras a mensagem era passada. “O que isto tem que ver com os cães e a boa impressão?”, perguntam vocês.– Tudo, respondo eu.
A comunicação dos nossos companheiros está presente, sempre, desde que estejamos atentos, mas infelizmente não os queremos ouvir. Ler a linguagem corporal dos nossos cães não é fácil, até para nós profissionais. Existem micro sinais que somente com um olho treinado ou gravando um vídeo é possível ver. Não digo nada de novo, eu sei, daí eu estar a escrever este texto, pois se é difícil ler os sinais mais subtis, deveria pelo menos ser nossa obrigação como companheiros de ver os mais evidentes, porque eles se esforçam constantemente por os fazer. Da próxima vez que vir o seu companheiro virar a cara, ou tentar escapar duma festa ou dum abraço… ouça-o. Pode ser que não seja a altura certa para essa atenção, ou a forma mais correcta de atenção. Não o obrigue a gritar e cause sempre uma boa impressão. JP Independentemente da língua de origem, todos concordamos que a palavra “não” é das mais usadas na relação diária com os nossos companheiros, em diferentes contextos e situações. Eu, para colocar todas aquelas formas de “não”, tive que me socorrer do google. A maioria das pessoas fala 2 a 3 línguas e ainda assim teriam que usar um tradutor para formular 10 formas diferentes de dizer não, mas existem muitas mais.
No entanto, achamos que eles, os cães, que não falam a nossa língua e nunca o irão fazer (embora por vezes até pareça o contrário), sem google, sem dicionários e nem com acesso a “telemóveis espertos”, têm obrigação de saber exactamente o que queremos dizer com esse som. ”Aua le taumafaina lena mea! Aua le tamoe! Aua le sogisogi! Aua le taumafaina lena mea! Aua le alu i le nofoa! Aua le pisa! LEAI….LEAI…”(1) Não vale ir ao google! É fácil de perceber, se os cães percebem, nós também temos que conseguir perceber… afinal, somos uma espécie inteligente. A mesma palavra para diferentes coisas, e geralmente acompanhada de:
Imaginem de entrar numa sala e lá uma mesa com 30 lugares, cada um para uma pessoa em específico, mas sem nomes escritos. Quando me dirijo a uma cadeira para sentar-me, ouço num tom de voz pouco simpático: ”LEAI e le o lou tulaga lea”(2). Então dirijo-me à segunda cadeira e: “LEAI e le o lou tulaga lea”(2). É provável que à terceira vez já não existisse a minha vontade de sentar ou talvez esperasse que os outros se sentassem. Claro que me podem dizer, mas então porque não perguntaste? A não ser que eu soubesse falar Samoano, imagino que não seria fácil. Obviamente a solução mais simples seria alguém acompanhar-me ao meu lugar. Não seriam precisas palavras e um sorriso bastava. Simples, não acham? Estamos muito focados na negação, naquilo que não queremos que aconteça. Esquecemo-nos de mostrar o que desejamos que aconteça ou que desejamos que o nosso companheiro aprenda. Criando situações claras que facilitem o sucesso, a comunicação fica mais fácil, mesmo sem perceber o significado das palavras. R&P (1)Não comas isso! Não corras! Não cheires isso! Não roas isso! Não vás para o sofá! Não faças barulho! NÃO…. (2)NÃO esse NÃO é teu lugar Existe ainda por parte de alguns humanos a ideia que só ao homem pertence o privilégio das emoções e que dizer que um de nós está feliz ou com medo é humanizar, e que "os cães são cães". Por outro lado, muito facilmente são usados adjetivos humanos negativos, dizendo que “o cão é teimoso”, que “o cão é ciumento”, que “é preguiçoso”, que “é mau”, e nestes casos a questão da humanização, ou antropomorfismo, já não se coloca.
Graças ao trabalho de vários cientistas, entre eles o Dr. Marc Bekoff e a Dr. Alexandra Horowitz, estas questões estão a ser clarificadas e desmistificadas. Não estando dentro da nossa cabeça, ainda assim podem dizer que sim, as emoções fazem parte de nós cães, tal como de outros animais que não humanos (isto dava para uma longa conversa). Tristeza, medo, alegria, excitação, prazer, frustração e ira são algumas das emoções que foi possível comprovar nos cães através do trabalho do Dr. Gregory Berns, assim como a nossa capacidade de identificar e responder às emoções dos humanos. São as emoções que definem as memórias dos humanos; a percepção do que os rodeia é também influenciada pelo seu estado emocional, afectando a construção da própria realidade. Como apresentado no livro de António Damásio “O Erro de Descartes”, os humanos dependem das emoções para as suas decisões e escolhas futuras que são baseadas em marcadores emocionais (ver o trabalho de António Damásio sobre marcadores somáticos). Em conclusão, os humanos não podem separar a emoção da razão, e se isto é verdade para eles, também o é para nós cães que com eles partilhamos a nossa vida e as nossas emoções. R&P |
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